Criança foi internada com 200 larvas na cabeça, e pais perderam a guarda.
Família vive em barraco e aguarda casa prometida pela Prefeitura de Goiânia.
Menina se recuperou dos ferimentos causados pelo berne na cabeça e pescoço (Foto: Fernanda Borges/G1)
A menina de 11 anos, que foi hospitalizada com mais de 200 bernes na região da cabeça e pescoço, em Goiânia,
completa cinco meses longe de casa neste sábado (31). Desde quando o
Conselho Tutelar interveio e pediu a retirada da guarda dos pais, em
janeiro deste ano, ela está sob os cuidados do Centro de Valorização da
Mulher (Cevam). A família aguarda por uma moradia em um programa
habitacional para tentar reaver a garota. Mas até que o sonho se
concretize, a criança conta os dias para voltar. “Não vejo a hora de
poder ficar com minha mãe, meu pai e meus irmãos. Tenho muita saudade
deles”, disse ao G1.A garota ficou três dias internada no Hospital Materno Infantil (HMI) e foi diagnosticada com pediculose (piolhos) e miíase – doença caracterizada por uma infestação de larvas de mosca, conhecidas como bernes. Ela foi levada ao hospital pelo pai, no dia 28 de janeiro deste ano e, segundo a unidade, foi tratada com antibióticos. A menina recebeu alta no dia 31 do mesmo mês, quando foi entregue ao Conselho Tutelar, que a encaminhou ao Cevam.
Para retirada dos bernes, a cabeça da garota precisou ser raspada. Na ocasião, ela também apresentava sinais de desnutrição. “Ela chegou aqui muito abatida, mas aos poucos foi se recuperando. Agora está bem mais gordinha e os cabelos começaram a crescer de novo. Virou outra criança”, afirmou a presidente do Cevam, Maria Cecília Machado.
Segundo ela, a menina é muito estudiosa e gosta de ajudar nas tarefas domésticas. “Isso mostra que ela era muito acostumada a fazer de tudo em casa. É uma garota esperta, que, apesar dos problemas que viveu, mantém laços fortes com os familiares”, relatou.
A mãe da menina, a diarista Edna Leite, 35 anos, costuma visitar a filha aos sábados. “Quando minha mãe chega, eu tenho vontade de chorar. Tenho muita vontade de voltar a morar com ela e meus irmãos. Meu pai ainda não veio aqui, mas ele me manda recados. Meu irmãozinho mais novo sempre me segura pelo rosto e fico feliz que ele se lembra de mim”, afirmou a criança.
A garota diz que é muito bem tratada no Cevam, estuda e faz diversas atividades, como natação e artesanato, mas que sonha em ter seu próprio quarto. “Minha mãe me contou que a gente vai ganhar uma casa, onde terei meu cantinho, minha cama. Quando for embora, vou sentir saudades de todos aqui. Mas estou torcendo muito para que a nossa casa fique pronta logo. É um sonho”, ressaltou.
Antes e depois mostra como estava e como ficou
cabeça de menina (Foto: Fernanda Borges/G1)
Dramacabeça de menina (Foto: Fernanda Borges/G1)
A família da menina mora em uma área invadida no Setor Urias Magalhães, na região norte de Goiânia, às margens do Rio Meia Ponte. No local, não há água encanada nem energia elétrica, e o esgoto corre a céu aberto. Em um barraco de madeira, vivem o pai, a mãe e outros três filhos, de 1, 4 e 14 anos. O casal ainda tem outra filha, de 20 anos, que saiu de casa para morar com o namorado.
A conselheira tutelar Daniela Dagilca explicou que a retirada da criança de casa foi necessária em função das péssimas condições em que vivia. “Essa família é acompanhada desde 2010, mas o problema é que eles vivem em extrema miséria. Levamos o caso ao Juizado da Infância e Juventude de Goiânia, que determinou que ela permaneça no Cevam até que os pais ofereçam melhores condições”, explicou.
Logo após a menina ser retirada de casa pelo Conselho Tutelar, a mãe da menina contou que tentou conseguir ajuda médica antes da situação com os bernes se agravar. “Ela tinha o cabelo comprido e isso disfarçava. Quando vi, fui ao posto de saúde e não queriam nos atender. Mas quando eles notaram, a levaram para o Hospital Materno Infantil. Aí tiraram a menina da gente”, disse Edna.
A diarista reconheceu que no ambiente em que mora é difícil manter a saúde dos filhos e pediu ajuda para deixar o local. “Eu tenho que trabalhar e não posso ficar aqui de olho neles o tempo todo. Quando eles estão na escola tudo bem, mas nos dias em que não há aula eles ficam aqui, sentindo esse cheiro forte de esgoto. Por isso, precisamos mudar daqui”, destacou.
Nova moradia
Após a repercussão do caso, a mãe da menina foi cadastrada pela Prefeitura de Goiânia em um programa habitacional. Ela aguardava há mais de 10 anos por uma moradia. Em fevereiro deste ano, o secretário Municipal de Habitação, Denício Trindade, garantiu ao G1 que a família vai ganhar uma casa no Residencial Antônio Carlos Pires, próximo ao Setor Orlando de Moraes, na região norte da capital. A previsão inicial era de que a mudança ocorresse até início de junho.
Família mora em um barraco e aguarda por
nova moradia (Foto: Fernanda Borges/G1)
O G1 procurou novamente a Secretaria Municipal de
Habitação (SHMAB) para saber se já existe uma data para a entrega da
residência, mas a secretaria informou que ainda falta a finalização dos
documentos junto a Caixa Econômica Federal, responsável pela construção.
“O nome dela [Edna] está entre os previstos para esse empreendimento.
Na próxima terça-feira [3] temos uma reunião com o banco para concluir
os procedimentos. Acreditamos que até o dia 15 de junho teremos uma
previsão de data para a entrega da casa”, explicou a diretora de
Pesquisa Social e Cadastro da SMAHB, Ana Alice Borges Bueno.nova moradia (Foto: Fernanda Borges/G1)
Edna já chegou a visitar a casa prometida pela prefeitura e, na época, disse que vai lutar para ter a guarda da filha de volta. “A casinha é linda, tem dois quartos e um banheiro, um sonho. Meus filhos menores ficaram encantados. Depois que mudar, vou procurar um emprego por lá para reconstruirmos a nossa vida e poder buscar minha filha”, ressaltou a mulher.
A conselheira tutelar Daniela Dagilca informou, ainda, que a família continua sendo acompanhada de perto e que, assim que a nova casa for entregue, a Justiça deve analisar como fica a questão da guarda da menina. “A gente nunca quis separar essa família. O objetivo foi resguardar a saúde da criança, que corria riscos. É notório que não falta amor entre eles e, sim, condições básicas de moradia e questões sociais. Sendo assim, quando tudo estiver caminhando bem, o juiz deve definir sobre a situação dela”, concluiu.