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2014/01/18

Com recesso na creche, catadora carrega as crianças pelas ruas de SP

Moradora da favela do Moinho (na região central de São Paulo) e mãe de três meninos, Fabiana da Silva, 35, é conhecida como a "catadora do som". Carregando uma carroça com o filho caçula e sobrinhos, ela procura o sustento da família no lixo dos "ricos". Ex-usuária de crack, passou pela antiga Febem quatro vezes e teve o primeiro filho na cadeia. Hoje, escreve o livro da sua vida e espera, com a venda, sair da favela.
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Depoimento:
Estou escrevendo o livro da história da minha vida. Meu sonho é ganhar um dinheirinho com ele para dar entrada em uma casinha e conseguir sair da favela do Moinho.
Enquanto não acabo de escrever, sustento a família catando o lixo dos ricos.
O pessoal aqui na região da Santa Cecília [região central de São paulo] me conhece como a "moça com a carroça com som". A música me distrai. Gosto de música gospel, mesmo não indo à igreja.
Cato coisas no lixo, mas não peço esmola.
Já pedi muito, mas já faz muito tempo. Eles te humilham, te xingam, te chamam de vagabunda. Prefiro abrir o lixo e caçar minhas coisinhas para ganhar um dinheiro.
Não peço nem uso as crianças para isso. Meu menor e meus três sobrinhos agora andam comigo porque as creches estão de férias e não dá pra deixá-los com o meu mais velho, de 13 anos, porque ele não cuida deles direito.
Levar as crianças atrapalha um pouco porque fica mais difícil, pesado, e diminuiu a busca. Tem que ser forte.
Na escola de um dos meus sobrinhos, até falaram que tinha a opção de levá-los para outra creche aberta, mas é lá perto da avenida do Estado. Não tem como ir até lá.
Na creche do meu menor, não teve opção. Fecharam em dezembro e só abrem agora no começo de fevereiro.

Fabiana da Silva

Marcelo Justo/Folhapress
 
Durante recesso da creche, Fabiana Silva, 35, puxa carroça com filho e sobrinhos em SP
Creche particular não dá. É muito caro. Quem sabe depois de terminar o livro.
Tem um pessoal que está me ajudando a escrevê-lo. O mesmo que me tirou das ruas, das drogas. Eles me internaram, insistiram em mim.
Deixei a casa da minha mãe aos nove anos. Na rua, onde vivi até os 23, aprendi tudo de ruim que existe nela. Descobri o crack. Descobri o crime. Roubei. Furtei. Fui internada quatro vezes na Febem [hoje, Fundação Casa].
Com 21 anos, fui presa por um roubo que eu não cometi. Não que eu fosse santa. Já fiz muita coisa errada, mas daquela vez não tinha feito.
É aquela coisa: um dia Deus castiga. Cumpri um ano e cinco meses de prisão sem dever. Conheci dentro da cadeia o dia mais feliz e o mais triste de minha vida.
O mais feliz foi ter meu primeiro filho. Só quem é mãe sabe a emoção que é. Quando ele decidiu nasceu, me levaram para o hospital e tive complicações no parto. Foi muito difícil.
Em seguida, veio a parte triste. Fiquei só um dia com meu menino. Depois levaram ele pra um abrigo e eu, de volta pra prisão. Só voltei a vê-lo 11 meses depois, quando terminei de cumprir a pena.
Depois da prisão, aprendi a ter mais respeito pelas coisas. E mais medo também.
Ensino aos meninos que a gente tem que trabalhar, suar pra conseguir as coisas.
Conheço família que vive de pedir, de geração em geração. Os filhos acabam seguindo esse caminho. É feio.
Papelão e latinha rendem muito pouco, R$ 15 no máximo por dia. Tiro minha renda mesmo das outras coisas que encontro no lixo.
Com sorte, até consigo tirar R$ 250 em um dia. Acontece quando passo por Higienópolis [bairro nobre] e encontro um móvel bom. Aí, pego e vendo na favela mesmo.
Ainda não sei quando meu livro ficará pronto. Dizem que pode ser em um ano.
Viver no Moinho não é ruim, mas tem muito perigo de fogo. A gente que tem filhos fica com medo.
Tenho fé em Deus que vai dar tudo certo

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