Wanda Suano Carvalho acolheu menina deixada pelo pai há 22 anos.
Flávia, hoje com 24 anos, passou por 19 cirurgias no Centrinho em Bauru.
Flávia e Wanda moram na pousada, ao lado do Centrinho (Foto: Wanda Suano / Arquivo pessoal)
A proprietária de uma pousada de Bauru
(SP), Wanda Suano de Carvalho, de 63 anos, é uma mãe adotiva que teve
um processo diferente para conseguir colocar o sobrenome na filha. Há 21
anos, ela e marido César receberam como hóspedes uma criança de dois
anos e o pai dela. A menina Flávia havia iniciado um tratamento no
Hospital Centrinho, referência em reabilitação de anomalias
craniofaciais, mantido pela Universidade de São Paulo. Após ser
abandonada pelo pai biológico durante o tratamento, Flávia enfrentou
várias cirurgias e um processo de adoção que teve um final feliz.Flávia Suano Carvalho, que até os onze anos se chamava Flávia Braga Barros, é natural de Niterói, no Rio de Janeiro. Hoje com 24 anos, ela é formada em administração de empresas, trabalha, fala duas línguas, fez balé clássico durante dez anos e passou por dezenove cirurgias. Para Flávia, Wanda e César são exemplos raros na vida de qualquer pessoa.
“Meus pais adotivos representam muita coisa. São duas pessoas que tenho como exemplos, que tiveram uma responsabilidade de cuidar de uma criança indefesa. Tinha os lábios abertos, problema de fissura, problema de fala, depois a perda da audição. Então, foi uma infância díficil”, lembra.
Antes de se tornar mãe adotiva, Wanda também enfrentou vários desafios. Ela saiu de Manaus em 1981 após conhecer o marido bauruense na capital do estado de Amazonas. Dona da pousada que fica ao lado do Centrinho, ela já presenciou muitas histórias de mães, pais e filhos que encararam as dificuldades do tratamento. No entanto, quando Flávia apareceu na pousada pela primeira vez, Wanda afirma que foi diferente. “Ela se hospedou e foi ficando, ficando e fazendo o tratamento. Vieram ela e o irmão. E me prontifiquei em cuidar dela. E quando foi um belo dia o pai dela sumiu, foi embora. Deixou o filho no orfanato e, Flávia, comigo. Às vezes, ele ligava dando sinal de vida. A Flávia foi ficando e a gente tratando de filha, mamãe e papai”.
Aniversário de 8 anos: Flávia ao lado de Wanda (Foto: Wanda Suano de Carvalho/Arquivo pessoal)
Quando Flávia estava com 11 anos, Wanda e César tiveram outro sinal de
que a criança ficaria com eles para sempre. “Aos onze anos ela escrevia
na poeira do vidro do carro, Flávia Suano de Carvalho, mas o nome dela
era Flávia Braga Barros. Meu marido perguntou se ela queria ser Suano de
Carvalho e, ela respondeu, que era o que mais queria”, disse Wanda.A dona da pousada pediu ajuda do Centrinho para o processo de adoção. “Me comuniquei com o hospital e serviço social tomou todas as providências. Viram advogado e todo o processo. Foi correndo os trâmites até que chamaram a gente no Fórum. E quando voltei para lá para saber do andamento do processo me disseram se era da Flávia Suano de Carvalho. Nessa hora me arrepiei toda. Quase fiquei louca de felicidade. Sai e no primeiro ‘orelhão’ liguei para o meu marido. Ele estava ensinando matemática para ela em casa. Quando avisamos ela, Flávia disse: ‘eu já sabia que ir ser uma Suano de Carvalho”, afirma.
Com o sobrenome novo de Flávia registrado em cartório, Wanda sentiu que realizava um sonho - o de ser mãe. “Fiquei grávida uma vez aos 37 anos, perdi, e não quis tratamento. Quando começamos a cuidar da Flávia já tinha 41 anos. Estava mais para avó que para mãe. Hoje eu curto a minha filha que nem dá pra imaginar. Somos bem amigas, minha companheira. Ela é tudo para mim. Foi um presente de Deus”.
A filha Flávia recorda a infância com Wanda e a primeira vez que a chamou de mãe. “Foi tudo acontecendo naturalmente. Com o tempo ela foi me contando sobre a minha família biológica. Cheguei a chamá-la de mãe com três anos, do nada. E isso pra mim é muito bom. Graças a eles que hoje eu tenho uma educação. Estudei, me formei, estudo até hoje, trabalho e gosto do que faço. Só tenho a agradecer."
Na adolescente, Flávia encarou mais um problema. “Do lado esquerdo não ouço nada sem o aparelho. E fui perdendo aos poucos a audição. Minha mãe foi percebendo e eu falava muito alto. Isso ainda estava na adolescência. Minha mãe sempre me acompanhou muito”, ressalta Flávia.
Além de Flávia, o pai biológico dela abandonou em Bauru o irmão, Jorginho, que até os 20 anos morou em um orfanato. “O irmão dela mora em casa com o meu marido e, na pousada, a Flávia fica comigo. Hoje ele está com 25 anos. Nunca deixei de frequentar o orfanato com a Flávia. Os dois são bem amigos”. No Dia das Mães, o desejo de Wanda é ver a filha crescendo com saúde. “Desejo o melhor sempre. Se não tivesse a minha filha não teria objetivo nenhum na vida. Um casal sem filhos é um jardim sem flores. Somos uma família feliz”.
Wanda, César, Flávia e o irmão, Jorge (Foto: Wanda Suano de Carvalho/arquivo pessoal)
Wanda guarda as duas certidões de nascimento e os outros documentos de Flávia (Foto: Alan Schneider/G1)