Foto: ONU: Meninas com sonho de
ser modelo acabam sendo levadas à prostituição.
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“O tráfico de homens, mulheres,
adolescentes e crianças está “correndo solto”, sem um controle mais efetivo, na
fronteira seca entre Mato Grosso e a Bolívia.
Embora aparentemente este tipo de
crime não aconteça, relatos demonstram a gravidade do problema que se mantém
silenciosamente.
A questão foi levantada em maio
deste ano pelo consul da Bolívia, Emílio Tamoyo, em evento em San Matias, na
Bolívia, dando conta especialmente de que crianças têm sido vendidas para a
retirada de órgãos e mulheres arregimentadas para exploração sexual.
“Passam pela fronteira sem
apresentar qualquer documentação e os raros policiais que ficam lá são
preocupados somente com mercadories, isso é um absurdo”, reage a advogada
Tatiane Barros, da Comissão de Infância e Juventude, da Ordem dos Advogados do
Brasil seccional de Mato Grosso (OAB), que compõe o Comitê Estadual de
Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Mato Grosso (Cetrap/MT).
O Cetrap/MT realizou, nos dias 5
e 6 de julho, curso de qualificação com foco especial em policiais que atuam na
fronteira mas também aberto a sociedade, em Cáceres (225 Km a Oeste de Cuiabá,
capital de MT), justamente na fronteira com a Bolívia.
O curso “Abordagens sobre o
Tráfico de Pessoas e Contrabando de Migrantes” é parte das atividades para
marcar a campanha internacional “Coração Azul”, que chama atenção para este
tipo de crime.
A intenção, com este curso, é
fortalecer a rede de combate local.
Campanha Coração Azul chama
atenção para o crime
O Coração Azul representa a
tristeza das vítimas do tráfico e nos lembra da insensibilidade daqueles que
compram e vendem outros seres humanos. A campanha é das Nações Unidas e busca
fazer do Coração Azul o símbolo internacional da luta contra o tráfico de
pessoas.
Subnotificados
Os casos de tráfico de pessoas,
que aparentemente são incomuns em Mato Grosso, na verdade estão na rotina, no
entanto não são caracterizados como tal e portanto são subnotificados.
Não há dados sobre a frequência
que ocorrem justamente porque não são devidamente notificados.
“Autoridades policias costumam
registrar somente a exploração ou outros crimes associados, mas, de modo geral,
não sabem notificar tráfico”, afirma a coordenadora do Cetrap, Dulce Regina
Amorin.
Ela explica que o tráfico
pressupõe retirada da pessoa do local onde ela vive forçosamente ou seduzindo
com planos irreais de melhoria de vida.
“Por isso que o tema da campanha
é não deixe que seu sonho vire armadilha”, realça ela.
A advogada Tatiane, da OAB,
ressalta que o Código Penal mudou há cerca de 2 anos para incluir exatamente
esta tipificação.
Destaca por fim que, é preciso
falar sobre isso, porque Mato Grosso é rota do tráfico de pessoas.
Casos escabrosos
A advogada Tatiane, que é muito
preocupada com esta questão, afirma que os relatos são escabrosos.
“As pessoas são enganadas”,
lamenta o secretário adjunto de Direitos Humanos da Secretaria de Justiça e
Direitos Humanos (Sejudh), que também confirma a ocorrência destes crimes em
MT.
Ele pede atenção aos policiais
federais e militares, aos conselheiros tutelares e a entidades e instituições
que atuam em prol das mulheres, principais vítimas.
Ele destaca que as vítimas, de
alguma forma, estão em vulnerabilidade, seja passando necessidades financeiras
graves ou em situação de abanadono.
Enganações mais comuns
– Você vai ser modelo famosa (a
mulheres)
– Você vai trabalhar em
restaurante (a mulheres)
– Você vai conseguir um bom
emprego (a homens)
– Você vai ser jogador de futebol
rico (a crianças e adolescentes)
– Você vai ser cantora famosa ou
modelo (a travestis)
Realidade
Na realidade, vítimas são
expostas a exploração sexual em boates ou a trabalho degradante.
Qualificação
“A proposta do curso é fazer com
que se consiga criar um olhar na ponta, em quem faz parte da rede de pessoas
que tem acesso a possíveis vítimas do tráfico. Mas é importante frisar que a
prática do tráfico de pessoas não está só ali na fronteira. Pode ocorrer em
qualquer lugar, seja na capital ou no interior do estado. A migração, ou
melhor, o processo migratório é um fenômeno normal. Existe por vários motivos:
econômicos, culturais, religiosos, políticos, dentre outros. Ocorre por pessoas
na busca da melhoria da qualidade de vida.
O problema é quando isso é objeto
de exploração. O que era sonho torna-se pesadelo”, explica o auditor fiscal Nei
Alexandre de Brito Costa da Superintendência Regional do Trabalho em Mato
Grosso, integrante da Coordenação Colegiada do Comitê Estadual de Prevenção e
Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Mato Grosso (Cetrap/MT).
O curso faz parte do Global Action
against Traffickin in Persons and the Smuggling of Migrants em tradução livre,
Programa Ação Global para Prevenir e Combater o Tráfico de Pessoas e o
Contrabando de Migrantes (GLO.ACT). O evento é uma realização do GLO.ACT Brasil
e da Secretaria Nacional de Justiça e Cidadania, em parceria com o Cetrap/MT.
Objetivo do programa é o
fortalecimento de capacidades e conhecimento de autoridades governamentais e da
sociedade civil para combater o tráfico de pessoas, o contrabando de migrantes,
e fornecer assistência às vítimas e migrantes vulneráveis.
O curso abordará a nova de lei de
enfrentamento ao tráfico de pessoas (Lei nº 13.344, de 6 de outubro de 2016) e
a nova lei de migrações (Lei nº 13.445, de 24 de maio de 2017) – ambas como
instrumentos de direito, de defesa, e de promoção de direitos. A Política
Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e as estratégias nacionais ao
contrabando de migrantes; o tráfico de pessoas e contrabando de migrantes na
fronteira seca, bem como a realidade local do Mato Grosso e da Bolívia também
estão na programação do evento.
Completam as temáticas abordadas
nos dois dias do curso os mecanismos de identificação e assistência às vítimas
de tráfico de pessoas e contrabando de migrantes, e estratégias de prevenção e
proteção à vítima.
Nei Costa informa ainda que todo
trabalho escravo é uma forma de tráfico de pessoas. “A exploração laboral é a
primeira causa do tráfico de pessoas”, explica. Este ano, segundo a SRT/MT,
cerca de 60 pessoas já foram resgatadas em operações do Ministério do Trabalho
apenas no estado do Mato Grosso.
Ele ressalta que o tráfico de
seres humanos é um crime que priva as pessoas de seus direitos, arruína seus
sonhos e rouba sua dignidade. É um crime que nos envergonha a todos. É um tipo
de crime subnotificado ou com tipificação equivocada. Por isso, os dados
existentes não refletem a realidade dos fatos.
Sobre o GLO.ACT
GLO.ACT é uma iniciativa conjunta
de quatro anos (2015-2019) da União Europeia (UE) e do Escritório das Nações
Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC), implementada em parceria com a
Organização Internacional para as Migrações (OIM) e o Fundo das Nações Unidas
para a Infância (UNICEF).
A iniciativa tem por objetivo
prestar assistência às autoridades governamentais e às organizações da
sociedade civil em 13 países selecionados estrategicamente (Bielorrússia,
Brasil, Colômbia, Egito, Quirguizistão, RDP do Laos, Mali, Marrocos, Nepal,
Níger, Paquistão, África do Sul e Ucrânia) no desenvolvimento e implementação
de respostas nacionais abrangentes de combate ao tráfico pessoas e contrabando
de migrantes.
O Brasil aderiu ao GLO.ACT no dia
5 de abril de 2017, por meio da Secretaria Nacional de Justiça e Cidadania, do
Ministério de Justiça e Segurança Pública, indicando o Departamento de
Políticas de Justiça (DPJUS) como ponto focal para o componente sobre tráfico
de pessoas, e o Departamento de Migrações (DEMIG) como ponto focal para o
componente de contrabando de migrantes do programa. Este compromisso foi
reafirmado com o lançamento oficial do Programa em 19 de abril de 2017, na Casa
da ONU, em Brasília.
Fonte: Gazeta Digital
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