2014/02/05

Menina é internada com mais de 200 bernes na cabeça e pescoço, em GO

Ela ficou três dias no hospital e foi levada para abrigo pelo Conselho Tutelar.
Pais vivem em barraco às margens do Rio Meia Ponte e têm outros 4 filhos.

Fernanda Borges Do G1 GO

Menina de 11 anos teve que cortar os cabelos para retirada das larvas (Foto: Fernanda Borges/G1)Menina de 11 anos teve de cortar os cabelos para retirada das larvas (Foto: Fernanda Borges/G1)
Uma menina de 11 anos foi hospitalizada, em Goiânia, com mais de 200 bernes na região da cabeça e pescoço.  De acordo com o Conselho Tutelar, a criança foi levada ao Hospital Materno Infantil (HMI) pelo próprio pai, que também tinha larvas no corpo e recebeu atendimento médico.  Após três dias internada, a garota recebeu alta e foi encaminhada ao Centro de Valorização da Mulher (Cevam).
Segundo a conselheira tutelar Daniela Dagilca Fernandes, a família é acompanhada desde 2010 e essa não foi a primeira vez que a menina foi diagnosticada com bernes - larvas da mosca-varejeira, que fazem cavidades e se alojam na pele. “O problema deles é muito grave, pois vivem em extrema miséria, em um barraco às margens do Rio Meia Ponte. Por isso, tivemos que intervir e retirar a menina de casa. Ela corria sérios riscos e precisava de cuidados emergenciais”, explicou ao G1.

A criança chegou ao HMI no último dia 28. Após ser avaliada, segundo a unidade, os médicos constataram que ela tinha pediculose (piolhos) e miíase (doença caracterizada por larvas, popularmente conhecidas como berne). Após ser tratada com antibióticos no pronto-socorro pediátrico, ela recebeu alta no dia 31 e foi entregue ao Conselho Tutelar.

Além das diversas feridas causadas pelos bernes, a criança também apresentava quadro de anemia e desnutrição. “Ela está muito magrinha e debilitada, até por causa dos remédios fortes que está tomando para curar os ferimentos. Ela lamentou um pouco ter que cortar os cabelos, que batiam no meio das costas, mas é muito consciente e sabe que isso foi necessário para o bem dela”, afirma a conselheira.
Após receber os cuidados no hospital, o Conselho decidiu levar a menina para o Cevam, onde ela toma os medicamentos de três em três horas e faz os curativos necessários. “Aqui ela está sendo muito bem cuidada e em breve vai se recuperar. A nossa luta agora é para ajudar o restante da família, já que não queremos simplesmente tirar a guarda da criança, mas sim restabelecer um ambiente seguro para que ela possa voltar”, disse Daniela.
Os pais têm outros quatro filhos, de 1, 4, 6 e 15 anos. A menina mais velha saiu de casa para viver com o namorado. “A criança que está no Cevam era a responsável por cuidar dos irmãos mais novos enquanto a mãe e o pai trabalhavam. O problema é que eles vivem em condições precárias, sem água potável e no meio do esgoto a céu aberto. Além disso, tomam banho no rio. Nessas condições, é quase impossível que essas crianças fiquem saudáveis”, ressaltou.
Menina está em abrigo, enquanto se recupera e juiz decide sobre destino (Foto: Fernanda Borges/G1)Menina está em abrigo, enquanto se recupera e juiz
decide sobre destino (Foto: Fernanda Borges/G1)
A conselheira diz que o problema com os vermes começou no período de férias escolares. “Conseguimos inscrever essas crianças em escolas de períodos integrais, onde elas tomam banho e se alimentam. Os pais ficam com a responsabilidade na parte da noite. Durante o recesso, ao que tudo indica, os cuidados com higiene foram deixados de lado e a menina ficou nessa situação”.
A mãe da menina, uma diarista de 35 anos, disse ao G1 que procurou ajuda quando percebeu uma ferida na cabeça da menina. “No posto de saúde do bairro Criméia Oeste eu tive que praticamente brigar com uma médica para que ela examinasse minha filha, pois diziam que ela não tinha nada. Até que viram o berne e mandaram que ela fosse para o Hospital Materno Infantil. Fiquei assustada ao saber da quantidade de bichos que tiraram”, afirmou.
A diarista reconhece que as condições em que os filhos vivem são de alto risco para a saúde, mas diz que se cadastrou em programas de habitação e está no aguardo de uma casa para deixar o barraco em que vivem. “Já nos prometeram muito, mas já são 10 anos e até agora nada. Já faz tempo que eu quero sair daqui, mas não tinha condições. Agora, depois do que aconteceu com a minha filha, eu e meu marido vamos tomar uma atitude e mudar para um barracão”, afirmou.
A mulher está desempregada, mas diz que na semana que vem deve começar em uma nova ocupação. O marido faz bicos e eles contam com doações para sobreviver. “Vamos pagar R$ 300 de aluguel e algumas pessoas se comprometeram a nos ajudar”, ressaltou a mãe.
Família mora em um barraco às margens do Rio Meia-Ponte (Foto: Fernanda Borges/G1)Família mora em um barraco às margens do Rio Meia Ponte (Foto: Fernanda Borges/G1)
Levados pelo Conselho Tutelar, os três irmãos menores e a mãe devem fazer exames médicos esta semana. “Depois da avaliação, vamos ver quais serão os próximos passos. Mas acho que não basta tirar as crianças dos pais e deixá-los lá. Esse não é o nosso papel, pois os filhos só são retirados quando não há mais o que fazer”, disse a conselheira.

Futuro
Daniela explica que o caso da menina foi encaminhado ao Juizado da Criança e do Adolescente, que vai definir o futuro da criança. “Não queremos colocar essa menina em um abrigo e deixar ela lá até os 18 anos. Ela tem família e os vínculos não podem ser perdidos. O que falta para eles é condições para viver em um ambiente saudável e não amor. A mãe é extremamente amorosa com os filhos, mas é uma pessoa muito simples e facilmente manipulável. O marido não ajuda, pois é alcoólatra e isso piora a estrutura familiar”, conta.
Esgoto escorre na frente de barraco em que família mora (Foto: Fernanda Borges/G1)Esgoto escorre na frente de barraco em
que família mora (Foto: Fernanda Borges/G1)
Daniela diz que o Conselho Tutelar acionou a Defesa Civil para que seja tomada alguma providência sobre a situação das moradias. No total, outras 10 famílias que moram na mesma área são acompanhadas, somando mais de 23 crianças. “Eles vivem em uma área de invasão. Então, sem endereço, nem nos programas sociais do governo podem ser inscritos. Queremos encontrar uma maneira de ajudar a todos, pois não adianta tirar um do risco e deixar os demais.”
Até que a situação seja definida, a menina permanecerá no Cevam. “Hoje [terça-feira] vou lá visitar ela. Estou com muitas saudades, pois ela é tudo para mim. É tudo muito difícil, mas vamos fazer o que for necessário para não perder a guarda dos meus filhos. Eu amo eles demais”, concluiu Edna.
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