2019/01/11

Justiça proíbe transporte de garis na parte externa de caminhões de lixo em cidade de MT

Justiça proíbe transporte de garis na parte externa de caminhões de lixo em cidade de MT


A Justiça do Trabalho concedeu liminares em duas ações civis públicas movidas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) contra a Cooperativa de Trabalho dos Prestadores de Serviços de Sorriso (Coopserv’s) e também contra a Cooperativa de Trabalho Vale do Teles Pires (Coopervale), com aplicação de multas de R$ 30 mil e R$ 50 mil.

As decisões visam o cumprimento de normas trabalhistas de saúde e segurança nos serviços de manutenção de iluminação pública e de coleta de resíduos sólidos no município de Sorriso. Uma das práticas proibidas é o transporte de garis na parte externa de caminhões de coleta de lixo.

As duas cooperativas foram contratadas pela Prefeitura em 2017 após vencerem uma licitação. A Justiça do Trabalho atendeu aos pedidos do MPT e estabeleceu multas de R$ 30 mil e R$ 50 mil para os casos de descumprimento das 47 obrigações impostas no total.

O MPT frisou nas ações que, nos termos da legislação vigente, a responsabilidade pela implementação das normas de saúde e segurança do trabalho é solidária, sendo, neste caso, também obrigação do Município adotar postura ativa para garantir que as contratadas respeitem as leis trabalhistas.

Na ação que corre contra a Coopserv’s e o Município de Sorriso, o Juízo da Vara do Trabalho de Sorriso proibiu o transporte de trabalhadores nos estribos e partes externas dos caminhões compactadores de lixo e de qualquer outro veículo utilizado para a coleta de resíduos.

A medida atende não apenas às Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho, mas também à NBR 14599 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e ao artigo 235 do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9503/1997), segundo o qual conduzir pessoas, animais ou cargas nas partes externas do veículo, salvo nos casos devidamente autorizados, caracteriza infração grave, estando o infrator sujeito à multa e retenção do veículo.

Essa liminar alcança os contratos e serviços que a Coopserv’s realizar ou for a beneficiária/tomadora nos municípios localizados na área de atuação da Procuradoria do Trabalho de Sinop - Cláudia, Feliz Natal, Santa Carmen, União do Sul, Vera, Sorriso, Boa Esperança do Norte, Ipiranga do Norte, Nova Ubiratã, Lucas do Rio Verde, Itanhangá e Tapurah.

O MPT destacou o caráter preventivo das decisões: “Quando em face de direitos fundamentais que vêm sendo coletivamente violados, a solução jurídica mais adequada é aquela que previne a lesão e não a que a ressarce após ocorrida”.

Em abril do ano passado, o MPT em Sinop instaurou Inquérito Civil para apurar as circunstâncias de dois acidentes de trabalho envolvendo garis de Sorriso. Em um dos acidentes, o trabalhador, ao pegar um saco de lixo na porta de um restaurante, acabou se cortando com uma faca que estava na sacola.

No mês seguinte, outro gari se acidentou durante o serviço. Ele caiu da parte traseira do caminhão de lixo, e acabou atropelado pelo veículo. A vítima, Jacques Germinal, de 43 anos, foi socorrida pelo Corpo de Bombeiros e levada ao Hospital Regional, mas não resistiu e morreu pouco depois.

O MPT, então, realizou inspeção para verificar as condições de trabalho dos coletores de lixo da cidade. Ao fiscalizar a cooperativa e a Secretaria de Obras da Prefeitura, responsável pela gestão do serviço de limpeza urbana, o perito constatou uma série de irregularidades que trazem riscos graves e iminentes, como quedas, choques mecânicos contra a estrutura do caminhão em caso de freada brusca, contaminação decorrente do contato direto com todo tipo de resíduo que se encontra depositado, exposição a ruídos, dentre outras.

“Pude identificar que durante a coleta de lixo os trabalhadores (coletores) são transportados nas áreas externas dos veículos, mais especificamente em pé no estribo do veículo, localizado na parte traseira do caminhão. Os coletores, com a utilização de sua própria força braçal e do seu equilíbrio corporal, precisam se agarrar numa barra de ferro transversal, alças nas laterais do veículo ou em cordas improvisadas amarradas na barra de ferro do caminhão, sendo estas as únicas medidas para se evitar uma queda do estribo”.

“Identifiquei ainda que os coletores empregam grande agilidade nas atividades de coleta de lixo, executando corridas pelas ruas da cidade de forma a coletar o lixo, e lançá-lo dentro da bacia de carga do caminhão-compactador. Em diversos momentos, o coletor corre em direção ao caminhão em movimento e pula para alcançar a barra de ferro, ou as alças laterais, atitude esta considerada por este perito como temerária, haja vista os riscos gerados decorrentes desta ação”, diz trecho do relatório.

Durante a inspeção, foi constatado que, apesar de obrigatória, a emissão da Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), relativa aos episódios do corte da mão do trabalhador Mauro José Farias e da morte de Jacques Germinal, sequer havia sido providenciada pela Coopserv’s.

Na conclusão, o perito salienta que as luvas utilizadas pelos coletores também não geram proteção adequada e que a cooperativa não possui Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT) e nem Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA) constituídos.

Os representantes da Prefeitura de Sorriso declararam no ato da inspeção que “os motoristas do caminhão do tipo coletor-compactador não haviam recebido nenhuma capacitação para a operação do caminhão; que não havia procedimento de trabalho para o serviço de coleta de lixo; que não existia ordem de serviço sobre segurança e saúde no trabalho para nenhuma função da Prefeitura de Sorriso".

Considerando a situação de insegurança dos terceirizados que prestam à Prefeitura os serviços de limpeza pública e de coleta de resíduos sólidos, o MPT salientou que “o trabalho em que não é assegurado o respeito ao meio ambiente laboral, propiciando riscos à saúde e à vida dos trabalhadores, privilegiando os aspectos econômicos em detrimento dos princípios da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho, ambos fundamentos da República, deve ser considerado antítese do trabalho decente, sendo modalidade de trabalho indigno, violador de direitos humanos fundamentais”.

Coopervale

Na ação movida contra a Coopervale, o MPT demonstrou que a contratada deixa de cumprir normas do trabalho em altura, de segurança em instalações e serviços em eletricidade e de segurança no trabalho em máquinas e equipamentos.

Também em relação à cooperativa o MPT apresentou relatório de inspeção realizada em suas dependências e na frente de serviço para averiguar as condições ofertadas aos trabalhadores na atividade de manutenção de iluminação pública e elétrica predial.

O laudo técnico, que inclui registros fotográficos e depoimentos, concluiu que a Coopervale tem colocado os cooperados em risco. Disponibiliza mão de obra para prestar serviços em eletricidade e em altura sem fornecer equipamentos de proteção individual (EPIs) suficientes e sem treinamentos específicos e satisfatórios, em desacordo com diversas diretrizes e obrigações impostas nas Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho.

Para se ter uma ideia, os trabalhadores utilizavam uma camionete com escada extensível acoplada em cima de uma estrutura de ferro chumbada na carroceria do veículo, em cima de um assoalho de madeira que estava em péssimas condições de conservação. A parte da escada extensível também era de madeira, a qual apresentava rachaduras, comprometendo ainda mais a resistência do material.

O Juízo da Vara do Trabalho de Sorriso concedeu a liminar pontuando que as irregularidades apontadas pelo MPT não só colocam em risco a saúde e a integridade física dos trabalhadores, mas a sua própria vida. “Nesse contexto, com vistas a resguardar a integridade física dos trabalhadores que se dedicam cotidianamente e se constituem na força motriz de produção da empresa, medida mais enfática deve ser adotada”, asseverou a magistrada.

Obrigações

À Coopervale foi fixado prazo de 30 dias para cumprimento das obrigações. O mesmo prazo foi concedido ao Município de Sorriso, ao qual cabe assegurar o respeito e a execução das obrigações em relação ao contrato firmado com a cooperativa.

O MPT solicitou a regularização de todos os problemas apontados, entre eles o fornecimento de EPI´s adequados e capacitação dos trabalhadores, de modo a abordar os riscos aos quais estão expostos e as medidas de proteção para a prevenção de acidentes e doenças.

Já a Coopserv’s tem 60 dias para promover a adequação do sistema de coleta de lixo. Até lá, deverá conduzir os garis nos estribos dos caminhões apenas durante o recolhimento do lixo e em baixa velocidade (no máximo 10 km/h).

Pela decisão liminar, o Município também tem prazo de 60 dias para assegurar o respeito e implementação das obrigações em relação ao contrato firmado com a terceirizada Cooperserv’s.

Em caso de realização direta dos serviços, o Município terá as mesmas responsabilidades da cooperativa e deverá fazer constar nos editais de licitação e contratos administrativos referentes aos serviços de limpeza pública e coleta de resíduos sólidos a proibição expressa do transporte de trabalhadores em caçambas dos caminhões, em estribos dos caminhões-compactadores de lixo ou em suas partes externas e em qualquer outro veículo utilizado na coleta de lixo.

Ao falar sobre o tipo de contratação, se direta ou indireta, por meio de cooperativa, a juíza afirmou não existir diferenciação quando se trata de meio ambiente de trabalho, reforçando que “(...) a sua higidez e equilíbrio são medidas que se impõem independentemente de tratar ou não de uma relação de emprego em sentido estrito, ou seja, as normas atinentes à segurança do trabalho são aplicáveis às relações de trabalho em sentido amplo e devem ser cumpridas por todos que se beneficiem da força de trabalho, seja direta ou indiretamente”.

Uma audiência foi marcada para o dia 27 de fevereiro na Vara do Trabalho de Sorriso. Os valores oriundos da aplicação de multas pelo descumprimento das obrigações serão revertidos a órgãos públicos ou instituições privadas sem fins lucrativos, que desenvolvam, neste último caso, atividades de interesse público, ou, ainda, a fundos legais voltados à seara laboral.


Vinicius Mendes olhar jurídico

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