Localizada na floresta boreal da Sibéria, enorme cratera
cresce, em média, 10 metros por ano e serve de alerta contra o desmatamento e o
aquecimento global
Um buraco de 1 quilômetro de extensão e 85 metros de
profundidade não para de crescer em uma remota região da Rússia e é chamado de
"porta para o inferno" por pessoas que vivem na região, que preferem
evitá-lo.
Mas cientistas asseguram que se trata de uma cratera única,
um registro detalhado de 200 mil anos de história da Terra.
Batagaika, a gigantesca cratera, emerge de forma dramática
na floresta boreal da Sibéria à medida que o permafrost - tipo de solo que está
sempre congelado - derrete como efeito do aquecimento global.
A cratera tem crescido na média de 10 metros por ano. Mas em
anos mais quentes, esse aumento chegou a 30 metros, conforme indicou estudo do
Instituto Alfred Wegener em Potsdam, na Alemanha. A instituição vem monitorando
o buraco há uma década.
Camadas expostas com o degelo do permafrost indicam como
eram clima, fauna e flora há 200 mil anos
A cratera representa uma rara oportunidade de observar, ao
mesmo tempo, o passado, o presente e o futuro.
As camadas de sedimento expostas revelam como era o clima na
região há 200 mil anos. Resquícios de árvores, pólen e animais indicam que, no
passado, a área foi uma densa floresta.
Esse registro geológico pode ajudar a compreender como será,
no futuro, a adaptação da região ao aquecimento global. E, ao mesmo tempo, o
crescimento acelerado da cratera é um indicador imediato do impacto cada vez
maior das mudanças climáticas no degelo do permafrost.
Desmatamento
A cratera apareceu na década de 60, de acordo com Julian
Murton, professor da Universidade de Sussex, na Inglaterra.
O rápido desmatamento na região deixou o terreno sem a
proteção das sombras das árvores nos meses de verão. Assim, os raios de sol
aqueceram o solo e aceleraram o processo de degelo, uma vez que era a vegetação
que mantinha o solo resfriado.
"Esta combinação de menos sombra e transpiração levou a
um aquecimento da superfície", explica Murton em entrevista à BBC.
Com o derretimento do permafrost, é possível que venham a
surgir mais crateras como também lagos e bacias hidrográficas.
Para o professor, "à medida que o gelo derrete em novas
profundidades, podemos ver o surgimento de paisagens novas".
Ao emergir, cratera revelou sinais de densa floresta que
existiu no local h? centenas de milhares de anos
Reconstituição histórica
Cientistas ainda trabalham na análise de sedimentos e tentam
decifrar a cronologia exata da cratera.
"Queremos saber se as mudanças climáticas durante a
última Era do Gelo esteve caracterizada por uma grande variabilidade, com
períodos intercalados de aquecimento e esfriamento", diz Murton.
A taxa de crescimento da cratera é um indicador direto do
crescente impacto das alterações climáticas no permafrost
Isso é importante porque a história climática de grande
parte da Sibéria ainda pode ser considerada um mistério. Ao reconstruir
alterações ambientais do passado, cientistas esperam conseguir prever mudanças
similares no futuro.
Há 125 mil anos, por exemplo, houve um período interglacial,
com temperaturas vários graus acima das registradas atualmente.
"Entender como era o ecossistema pode nos ajudar a
entender como a região se adaptará ao atual aquecimento do clima", afirma
o professor Julian Murton.
'O aquecimento acelera o aquecimento'
A cratera Batagaika pode oferecer lições cruciais, em
especial sobre os mecanismos que aceleram o aquecimento em áreas de permafrost.
À medida que o degelo avança, mais e mais carbono é exposto
a micróbios. Estes micro-organismos consomem carbono e produzem dióxido de
carbono e metano - gases causadores do efeito estufa.
À medida que o permafrost degela, gases como dióxido de
carbono e metano são liberados e aceleram o aquecimento global
O metano é capaz de acumular 72 vezes mais calor que o
dióxido de carbono num período de 20 anos.
Além disso, os gases liberados pelos micróbios na atmosfera
aceleram ainda mais o aquecimento.
"É o que chamamos de 'feedback positivo'", explica
Frank Gunther, do Instituto Alfred Wegener. "O aquecimento acelera o
aquecimento e, no futuro, poderemos ver mais estruturas como a cratera de
Batagaika", completa o pesquisador.
Segundo o pesquisador, não há nenhuma obra de engenharia que
possa conter o desenvolvimento dessas crateras.
UOL
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