Cidades que mais crescem no Brasil estão em MT; as que mais definham também Cenário da cidade de Itauba, no Norte de Mato Grosso: arco da decadência em Mato Grosso
Ao fundo, uma fila de colheitadeiras vai arrancando as últimas vagens da plantação. Cortando o horizonte, carretas e caminhões carregados de soja ‘serpenteiam’ entre os buracos da BR-163, no Norte de Mato Grosso. Entre um acidente ou outro, uma morte aqui e outra ali, a situação revela a falta de infraestrutura latente de uma região há muito declarada próspera, rica, muita rica. Nesse cenário de extremos, aparece Lucas do Rio Verde, conhecida com a sua alta qualidade de vida e alto Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil. Resultado dessa pujança, mesmo com o sufoco provocado pelo desleixo governamental, acaba de ser confirmado agora: o IBGE colocou a cidade como a sétima no pais que mais cresceu em índice populacional entre 2000 e 2013. Chegou a 173,6%.
Pertinho de Lucas, nos índices, com o mesmo cenário econômico e de desenvolvimento humano com similaridade, embora em outra região do Estado, aparece Sapezal, no meio Oeste, que cresceu 166,1%. Mas também poderia ser Sorriso, cuja população dobrou nesse período, chegando a 110% de aumento. Poderia ser Nova Mutum, com incremento de 147% ou outra cidade da região. O cenário não é diferente em Campo Verde, no lado Leste do Estado, que passou de 100% também. Por todos os cantos do Estado, o agronegócio segue atraindo gente e mais gente – e problemas, claro, muitos problemas.
A rigor, por conta desse fluxo populacional de Mato Grosso segue com sua população em ascendência. Já foi bem maior, desacelerou bem, mas continua. De acordo com os números do IBGE, das 141 cidades do Estado, 103 tiveram aumento populacional no período. Algumas com crescimento muito pequeno, outras estagnadas, como Poconé, uma das mais antigas e pacatas cidades do Estado, portal de entrada do Pantanal Matogrossense. Descoberta em 1777, a cidade cresceu apenas 4% entre 2000 e 2013. Traduzindo em gente: pulou de 30.773 para 32.053.
As demais, isso mesmo, as outras 38, estão se definhando. Fora da rota do agronegócio, parecem sobreviver do quase nada. Caso de Itauba. A cidade está situada ao Norte do estado a 570 quilômetros da capital Cuiabá. Nesse período da virada do século até agora, perdeu metade de sua população. É, do pais, a quarta que teve mais expressiva queda populacional. A frente estão apenas para Maetinga, na Bahia, Brejo da Areia, no Maranhão e Severiano Melo, no Rio Grande do Norte, em pior decadência. Os vizinhos de Itauba estão nas mesmas condições: União do Sul, por exemplo, perdeu 13% da população. Em São José do Xingu, a queda foi de 10%. Em Terra Nova do Norte, a população reduziu 26%. Em Tabaporã, menos 10%. Ali por perto, mais a noroeste do Estado, Aripuanã perdeu 27%. Pode até ser chamado de 'arco da desolação'.
Outra cidade que está em situação populacional crítica em Mato Grosso é Novo São Joaquim, no Vale do Araguaia. A cidade nunca foi um primor para seus habitantes e sempre figurou na lista dos municípios com grau relativo de deficiência econômica. Em 13 anos, perdeu 40% da população. Desceu de 9,4 mil habitantes para 5,6 mil. Outros municípios ali por perto como Poxoréo, Planalto da Serra e Araguaina estão na mesma situação, ou seja, decadência populacional confirmada. É, em verdade, uma 'cortina de tristeza' no Leste do Estado - em região que já foi chamada de 'Vale dos Esquecidos', com toda razão.
Especialistas apontam que o percentual de cidades que encolheram pode ser explicado pela combinação de dois fatores: a redução da fecundidade geral no país e os processos migratórios internos. Segundo dados do Censo Demográfico de 2010 divulgados em 2012 pelo IBGE, a taxa de fecundidade brasileira caiu de 6,16 filhos por casal em 1940 para 1,9 entre 2000 e 2010. Para a população continuar crescendo, o nível mínimo é de 2,1. Por isso, o ritmo de aumento da população no país passou de 3% ao ano na década de 50 para 1,17% na última década.
No caso de Mato Grosso, a clareza dos aspectos sócio econômicos são flagrantes. Nas cidades em queda populacional é notório o fim dos ciclos de exploração. Itauba, por exemplo, sobreviveu por muitos anos da extração dos recursos florestais. Tenta agora usar os ‘clarões’ na floresta para plantio de grãos. Mas a calamidade toma conta da região. No começo do mês, como de costume, o cenário era gritante: atoleiros, pontes caídas, estradas intransitáveis, alunos sem poder estudar devido às péssimas condições das estradas. Neste ano, o Governo chegou a reconhecer a ‘Situação de Emergência’ devido a precariedade em tudo. Para se ter uma idéia, produtores rurais falaram em grandes perdas.
Diante de tantas dificuldades, o esgotamento acabou sendo um processo natural em Itauba e nas outras 37 cidades com queda populacional em Mato Grosso. Não quer dizer absolutamente que cidades como Lucas do Rio Verde, no ‘topo’ do IDH-M e do crescimento populacional, estejam vivendo as maravilhas dos benefícios desenvolvimento mesmo com sua rica economia. Pelo contrário. A diferença entre a ‘cidade dos grãos de ouro’ e daquela que foi um dia próspera na venda de madeira, em verdade, situa-se apenas no campo das perspectivas futuras. Lucas tem tudo para crescer mais e sobreviver. Itauba, corre risco.
Em comum, enfrentam problemas de segurança pública, saúde e infraestrutura urbana e rural. Em Lucas, por exemplo, apesar de tudo, seus cidadãos são taxativos ao dizer que a cidade precisa avançar no tratamento do lixo, no saneamento básico e nas políticas públicas de cultura, no transporte público urbano e na recuperação das áreas de reserva legal. Como acontece também em Itauba.
No cenário onde caminhões e carretas carregados de soja que cortam no horizonte a BR defeituosa e perigosa, o caos social é tão fomentado como nas estradas de floresta, pela qual carretas e caminhões carregados da produção ficam atolados por vários dias em verdadeiros lamaçais.
E para que não paire duvidas, há pouco, por conta desse crescimento latejante, o município de Lucas do Rio Verde, o rico do momento, foi obrigado a enfrentar graus elevados de criminalidade com a expansão da agroindústria e a chegada de mais gente. A Prefeitura teve que assinar um acordo com uma das maiores empresas do ramo de alimentação, o Grupo BRF, para eliminar os impactos sociais causados pela necessidade de se atrair mais mão de obra.
“O crescimento do município tem provocado problemas sociais de segurança pública e cidadania, inclusive com altos índices de criminalidade” – define o prefeito Otaviano Pivetta, que cobra atuação do Governo.
Ou seja, o caminhar das duas cidades em rumos opostos, seguem a mesma trilha em que o Estado que muito se cobra e pouco se oferece em todas as áreas.
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